Edmundo Pedro faz amanhã, 8 de Novembro, 90 anos. O núcleo redactorial deste blogue e a direcção do Movimento «Não apaguem a memória!» desejam-lhe as maiores felicidades e continuarão a contar com ele para muitos e entusiásticos combates.
«Percurso existencial», escrito por Edmundo Pedro propositadamente para este blogue
Comecei a trabalhar aos doze anos numa oficina de serralharia. Daí em diante, interrompi o curso diurno da Escola Industrial Machado de Castro e passei a estudar à noite. Aos treze, entrei para o Arsenal da Marinha. Aí conheci dois vultos cimeiros do movimento operário de então, meus colegas de trabalho na oficina de máquinas do Arsenal: António Bento Gonçalves e Francisco Paula de Oliveira. Este último viria a celebrizar-se sob o pseudónimo de “Pavel”.
O primeiro era então Secretário-geral do PCP, o segundo Secretário-geral da Federação da Juventude Comunista. Ambos exerceram no meu espírito uma influência determinante.
Filiei-me na Juventude Comunista aos treze anos, pouco depois de ser admitido naquela empresa do Estado.
Fui detido pela primeira vez pela polícia política no dia 17 de Janeiro de 1934, pouco depois de ter completado os 15 anos de idade, por estar envolvido na preparação da tentativa de greve geral que deflagraria no dia seguinte. A minha primeira detenção está, pois, estreitamente ligada ao movimento de protesto contra a liquidação do sindicalismo livre. Esse movimento ficaria conhecido na história das lutas operárias como o «18 de Janeiro». Pela minha acção na preparação desse evento, fui condenado pelo Tribunal Militar Especial, acabado de criar por Salazar, à pena de um ano de prisão e à perda dos «direitos políticos» durante cinco anos…
Logo que fui libertado, retomei a oposição à ditadura como militante da Juventude Comunista. Em Abril de 1935 fui eleito, com Álvaro Cunhal, entre outros, para a direcção da Juventude Comunista.
Preso, uma vez mais, em Fevereiro de 1936, sob a acusação de ser dirigente da JC, acabaria, em Outubro desse ano, por ser deportado para Cabo Verde, onde fui estrear o tristemente célebre Campo de Concentração do Tarrafal. Ao fim de nove anos, regressei a Lisboa para ser, de novo, julgado no Tribunal Militar Especial. Depois de ter aguardado julgamento, ao todo, durante dez anos, fui condenado, por aquele tribunal de excepção, à pena de vinte e dois meses de prisão correccional, acrescida da perda dos «direitos políticos» pelo período de dez anos!
Ao longo de todo tempo que mediou entre o fim de 1945 e o 25 de Abril de 1974, conspirei sempre contra a ditadura. De forma especialmente activa, a partir da campanha para a Presidência da República do general Humberto Delgado, durante a qual comecei a preparar, com Piteira Santos, Varela Gomes e outros, um movimento insurreccional que pusesse fim à ditadura.
Estive envolvido, com o grupo inspirado por Fernando Piteira Santos, no «12 de Março» de 1959. Mas, dessa vez, não fui referenciado na polícia política.
Dois anos depois, no dia 1 de Janeiro de 1962, tomei uma parte muito activa no chamado «golpe de Beja», ocorrido na madrugada daquele dia, no Quartel de Infantaria Três, aquartelado na cidade de Beja. Depois daquele movimento ter abortado, fugi para o Algarve onde fui detido, em Tavira, na manhã desse mesmo dia, junto com Manuel Serra e o então capitão Eugénio de Oliveira. Pela minha intervenção nesse movimento fui condenado, em 1964, a três anos e oito meses de prisão maior e à perda do «direitos políticos» pelo período de quinze anos. Cumpri quatro anos de cadeia. Fui libertado no fim de 1965.
Aderi ao Partido Socialista, por intermédio de Mário Soares, em Setembro de 1973. Sou, portanto, um dos fundadores daquele partido.
No primeiro congresso realizado na legalidade, em Dezembro de 1974, fui eleito para a sua Comissão Nacional e, em seguida, para a sua Comissão Política. Fui integrado no seu Secretariado Nacional em 1975. Em 25 de Abril de 1976, nas primeiras eleições legislativas, fui eleito Deputado pelo PS. Exerci esse cargo durante onze anos. Em 1977/78, fui designado Presidente da RTP. Actualmente continuo no PS, mas como militante de base.
Ninguém na minha família escapou à repressão salazarista. O meu pai estreou comigo o Campo de Concentração do Tarrafal. Esteve ali, tal como eu, cerca de nove anos. Foi, reconhecidamente, o mais perseguido de todos os presos daquele presídio de má memória. É considerado o mártir do Tarrafal. Morreu no exílio, em França, dois anos antes do 25 de Abril. A minha mãe esteve detida durante longo tempo por ser militante do PCP. A minha irmã Gabriela, que fugira de Portugal para evitar ser detida pela sua actividade no âmbito do movimento estudantil, morreu em Paris, aos vinte anos, na emigração política. Um irmão meu, o João Ervedoso, foi assassinado no âmbito de uma manifestação estudantil, por um provocador ao serviço da polícia política, quando tinha acabado de completar catorze anos. O meu irmão Germano, o mais novo dos três, entretanto falecido, esteve detido durante três anos por envolvimento na preparação da tentativa insurreccional de Beja. A minha própria mulher, para não fugir à sina da família, também experimentou os cárceres da polícia política.
Sexta-feira, 07.Nov.2008 at 08:11:43
8 de Novembro seria uma boa data para o lançamento do 2º volume das memórias de Edmundo Pedro (o 1º volume deveria mesmo ser reeditado e distribuído gratuitamente a todos os militantes das juventudes partidárias).
Como não poderei estar no jantar de homenagem a E.P., deixo aqui um agradecimento ao Edmundo Pedro pela coragem que demonstrou ao longo de toda a sua vida.
‘Que conte muitos’. Pedro Martins
Sexta-feira, 07.Nov.2008 at 12:11:34
Já chegaste aos 90 anos, bonita idade, ainda és um jovem! Hoje quando contacto aqueles que não passaram pela Ditadura Salazarista e de Caetano, que combateste com outros e foste um dos seus opositores, mete dó a falta de conhecimento e reconhecimento aos que nos permitiram crescer e nascer num Portugal Livre!
Nos programas escolares quando quase não se fala disso, e quando fala é muito ao de leve. Não fossem alguns professores (teimosos e ainda bem!) e muito menos saberíamos.
A indignação quando os torcionários da ex-DGS (PIDE, PVDE) recebem pensões e honrarias “pelos serviços prestados à Pátria” e outros são esquecidos quando passaram as “passas do Algarve” nas cadeias, quando foram obrigados ao exilio ou ainda o caso do capitão Salgueiro Maia!
Como me ensinaram numa música quando era pequeno – Somos um Povo que cerra fileiras, parte à conquista do pão e da paz, como ela (a gaivota) somos livres, não voltaremos atrás”.
Obrigado pelo exemplo!
Quantos muitos, Edmundo!
Sexta-feira, 07.Nov.2008 at 07:11:46
Tenho imensa pena de não estar em Lisboa para participar no jantar gostaria muito de o conhecer!!!! Quelle vie!!!! Quel exemple!!!
Que dire de plus qu’un grand MERCI pour nous, les jeunes et les generations à venir.
“QUE CONTE MUITOS”. Vous avez surement encore plein de choses a nous apprendre.
Um abraço
Rosa
Segunda-feira, 10.Nov.2008 at 02:11:27
Sou grata, acima de tudo, por tudo o que viveu em prol da Liberdade, aquela que nos permite, hoje, estar aqui.
Grata, também, pelo testemunho aqui compartilhado, pela memória em nós assim registada.
“QUE CONTE MUITOS”!